quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Recado a Dilma


                              Nada mudou. Mas pode mudar.

      A eleição presidencial mais disputada da história do país. Nunca antes um candidato fora eleito ou reeleito para o cargo político mais importante do Brasil com uma margem percentual de votos tão apertada: 3,24% a mais para Dilma Rousseff. A já superada menor vantagem registrada de um presidenciável vitorioso em relação ao segundo colocado datava de 1955, quando Juscelino Kubitschek ganhou a corrida com vantagem de 5,44%. A emoção, de fato, esteve presente até os momentos finais na apuração: até por volta de 19:30Hs, Aécio Neves liderava, porém uma parcela significativa de votos da região Nordeste ainda não tinham sido contabilizados. O PT completará, em 2018, 16 anos à frente do país. A tendência de continuidade das estruturas de poder montadas nos governos Lula e Dilma é clara. Todavia algumas posturas que caminham a mudanças mais profundas foram sinalizadas.  
      A campanha foi a mais acirrada da história, assim como pode-se afirmar que foi uma das mais sujas. Vasculhou-se tudo, até mesmo sobre as vidas particulares dos candidatos a presidente, tendo as redes sociais dado suporte às acusações, na maioria das vezes, infundadas e irracionais. Na antevéspera da eleição, a disputa esquentou ainda mais por conta da publicação de uma reportagem na revista "Veja", que denunciava a conivência de Lula e Dilma acerca de escândalos de corrupção na Petrobrás. A reação da militância petista foi, ao mesmo tempo, imediata e absolutamente condenável de depredar a entrada da sede da revista.
      Foi um risco assumido pela diretoria da "Veja" ao autorizar a publicação de uma denúncia que ainda não pode ser comprovada já que os depoimentos de envolvidos no caso não foram oficializados nem divulgados integralmente. Além disso, a revista usualmente é posta em comercialização aos domingos, mas parte de seus exemplares já estava nas bancas na sexta-feira, dois dias antes do 2° turno, o que levanta fortes indícios de tentativa de induzir o voto dos eleitores. Sou estudante de Jornalismo e defendo a liberdade de expressão da imprensa. Mesmo assim, não considero-a acima de qualquer suspeita e seus erros, ligados sobretudo às questões ética e de imparcialidade, não podem passar desapercebidos. Esse foi um deles.
      Dilma Rousseff em seu primeiro pronunciamento após reeleita fez sinalizações que mostram uma clara disposição ao diálogo com a oposição, cujo ótimo desempenho de Aécio a fortaleceu. Um comportamento diferente daquele durante seu primeiro mandato, marcado por uma incisiva determinação da presidenta em conduzir o governo sob suas vontades. É uma atitude louvável em um cenário no qual somente um pouco de diálogo e consenso podem reverter problemas como a inflação próxima de bater o teto da meta estipulado, o baixo crescimento do PIB, metas fiscais e a crise energética, bem como outras pautas: saúde, educação, segurança, transporte e habitação.
      Por outro lado, a trajetória política de militância da presidenta durante a Ditadura Militar, que a marcou física e psicologicamente, estabelece uma questão prioritária, de honra, para o seu próximo ciclo de governo: a realização de um efetiva reforma política, que restrinja o financiamento empresarial às campanhas, puna com mais rigor crimes, como o de "caixa 2", entre outras medidas a fim de que a política não seja tão refém de interesses que não condizem com o bem-estar comum como é atualmente.
      Caso Dilma entenda o recado de mudança tão propagado na campanha e presente desde as manifestações do ano passado, ela honrará os princípios que passou a defender nos "anos de chumbo", apesar dos obstáculos que se impõem contra isso. Que suas palavras no discurso da vitória não sejam apenas para embelezar o seu texto.

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Tudo velho de novo?

                                       Que dessa vez seja diferente.


      Apesar da já esperada disputa acirrada, a eleição presidencial de 2014 tinha até 13 de agosto um quê de previsibilidade. O principal embate estava polarizado entre o PT, de Dilma Rousseff, e o PSDB, com o candidato Aécio Neves. Com a morte de Eduardo Campos, a reviravolta foi tão grande que uma nova eleição começou a se desenhar. Porém, o resultado do 1° turno realinhou a corrida ao Planalto entre os adversários tradicionais. A chapa de terceira via, ao ser liderada, de fato, por Marina Silva ganhou força, amedrontando a presidenta e causando histeria na campanha tucana, mas perdeu fôlego na reta final.
      Marina Silva, Dilma Rouseff e Aécio Neves, individualmente, possuem trajetórias políticas marcantes e singulares. A candidata do PSB talvez tenha o passado mais tocante e comovente: de seringueira e alfabetizada apenas aos 16 anos a presidenciável. A 36ª líder do Brasil foi uma militante aguerrida durante a ditadura militar e enfrentou-a até as consequências mais drásticas, como a tortura. Já Aécio, criado em um ambiente altamente politizado por ser neto de Tancredo Neves, participou do movimento Diretas Já.
      O PT saiu vitorioso no 1° turno com mais de 41 milhões de votos dados a Dilma. Os programas sociais arrebatam milhões de seguidores, mas no segundo turno o partido continuará debatendo temas espinhosos e falhas na condução do governo, nos últimos 4 anos: desaceleração da economia e casos de corrupção. Além disso, a tática do medo, da qual o PT fora vítima e agora usa a seu favor assim como muitos quando chegam ao governo, dever ser persistente, infelizmente, em seus programas eleitorais.
      Marina Silva chegou a liderar em pesquisas de intenção de voto tanto no 1° quanto no 2° turnos. Entretanto, suas contradições e hesitações quanto a propostas de ampliação de direitos ao grupo GLBT, por exemplo, fizeram a candidata não ir, mais uma vez, à fase decisiva do pleito. Marina desejava muito que a eleição tivesse acontecido uma semana antes do dia 5 de outubro, pois ainda estaria na frente de Aécio. Os bombardeios de Dilma e Aécio contra Marina, inimiga comum aos dois naquele momento, também a comprometeram. Diferentemente de 2010, quando também não disputou o 2° turno, ao manifestar publicamente seu apoio a Aécio Neves, busca ser mais atuante, mas, ao mesmo tempo, reforça suas contradições: Se fosse Marina Silva fiel aos seus ideais em defesa da "nova política", não apoiaria nem Dilma nem Aécio, cujos  partidos ela aponta como os principais representantes da "velha política".
      O candidato do PSDB enfrentou muitos dilemas em sua caminhada até agora. Negociou intensamente o apoio da ala paulista tucana, indignada por não ter Serra ou Alckmin como nomes à presidência pelo partido, e enfrentou problemas nos bastidores que quase causaram a sua renúncia à disputa quando foi ultrapassado por Marina nas pesquisas. Todavia, sua derrota dupla em Minas Gerais, para Dilma e para o candidato petista a governador, mostram que ele não é tão unânime quanto afirma ser, em seu estado-natal, na propaganda eleitoral.
      A reviravolta a favor de Aécio o fortaleceu bastante para os próximos intensos dias de campanha pelo Brasil e isso se comprova através do empate técnico no último levantamento feito pelo IBOPE. Restam praticamente 10 dias para  "o dia D" e o Brasil deseja ouvir propostas para um futuro melhor. Tudo é possível e não se pode apontar um favorito. É, porém, lamentável que, nessa terça-feira, quando os dois candidatos se reencontrarão em mais um debate na Rede Bandeirantes de televisão, à noite, seja marcada novamente por ataques desmoralizantes e às vezes infundados. Não queremos e não merecemos isso.

                                                                 Mattheus Reis