domingo, 20 de setembro de 2015

Ponto final

                                            O enfático "não" do STF


Tesoura nas campanhas: Políticos precisarão se adequar
à nova realidade de recursos disponíveis nas eleições.
       Após um longo debate envolvendo o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional, com idas e vindas políticas, a maior instância judiciária do país decidiu, em julgamento na última quinta-feira, caracterizar como inconstitucionais as doações de empresas durante as campanhas eleitorais. A partir de agora, portanto, financiamentos do tipo estão proibidos, e qualquer tentativa de algum grupo político reverter as novas regras provavelmente não será bem-sucedida no Congresso, sob a justificativa de desrespeitar a Constituição Federal. Embora não esteja explícita uma proibição aos financiamentos privados nos seus artigos, outros princípios-base da Lei Maior do País, como democracia e  equidade, influenciaram os votos de 8 dos 11 juízes do STF.   
        A maioria esmagadora das últimas campanhas obteve maior parte de seus recursos por intermédio de doações de empresas que atuam em diversos setores, como o bancário, da construção civil até mesmo o alimentício. De acordo com uma reportagem do jornal "Estado de São Paulo", as 10 que mais doaram em 2014 distribuíram, independentemente de preferência político-partidária, cerca de R$ 160 milhões entre 360 dos 513 deputados eleitos por mais de 23 partidos.
       Na corrida presidencial os números são ainda maiores e, por que não, revoltantes: 95% dos R$ 350 milhões arrecadados pela campanha de reeleição de Dilma Rousseff, 87% dos R$ 227 milhões declarados pelos administradores da campanha de Aécio Neves e 87% dos R$ 44 milhões financiados para Marina Silva vieram de contribuições privadas, segundo o jornal "O Globo" e com base nas prestações de contas entregues pelos comites dos candidatos à Justica eleitoral.
        Esses valores estratosféricos, por si só, já seriam suficientes para o debate sobre maiores restrições. A falta de regras anteriormente ocasionou uma hiperinflação das candidaturas. Além disso é inegável a influência exercida pelo poder econômico nas decisões políticas e no voto da população.  Empresas, em geral, buscam retorno quando  "investem" em políticos. Os exemplos de fraudes, favorecimentos ilícitos em licitações e superfaturamentos de obras cometidos  por empreiteiras e desvendados pela operação Lava-Jato são apenas uma amostra das "recompensas" cobradas em troca de preciosos votos.  As eleições, muitas vezes, se transformam em um "vale-tudo" pelo poder, e quanto mais recursos - não importa de onde vêm - maiores as chances de uma campanha mais forte, melhor administrada e de vitória.
        A partir de 2016, as fontes de arrecadação legais serão as contribuições de, no máximo, 10% da renda anual de pessoas físicas e o dinheiro público do Fundo partidário, que foi expandido justamente prevendo o fim das doações privadas. Essa é uma das principais polêmicas da nova regra: quando é cogitado o uso de dinheiro público para as campanhas, muitas críticas surgem, evidentemente, entre a população, farta de pagar uma das maiores cargas tributárias do mundo e, dificilmente, ver o retorno esperado na qualidade de vida.  Ao eleitor, entretanto, é preciso ficar claro que o dinheiro até então destinado, nas eleições, pelas empresas era, sobretudo, fruto dos lucros obtidos com a compra de produtos e serviços pelos cidadãos.
       De qualquer forma, somos nós quem pagamos a conta da farra política. O fato do dinheiro ser público pode inibir a submissão  de muitos governos à influência politica das empresas, que não deveriam participar ativamente de eleições, cujo resultado é, em tese, reflexo apenas da vontade popular. Os votos antes conquistados através do dinheiro e da influência precisarão vir, agora, de um diálogo mais próximo com as demandas da população.
       Apesar da tendência de barateamento das campanhas, são inúmeras as ações a serem tomadas ainda com a finalidade de ser garantida uma maior transparência nas práticas eleitorais e um maior compromisso  com o bem-estar da população. Instituir limites mais severos de gastos em eleições e coibir as arrecadações não declaradas e, portanto, ilegais, das quais empresas, mesmo a partir de agora proibidas, podem participar ("caixa-dois") são as pautas que deveriam fazer parte de um debate permanente. O "não" do STF precisa ser o "sim" para o início de uma tão sonhada e, ao mesmo tempo, tão distante reforma política efetiva, que combata a corrupção e amplie poder de participação popular nas decisões políticas.


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                                                          Mattheus Reis