sexta-feira, 13 de março de 2015

Lembre-se de outubro

                                                    As regras do jogo
    
       Inegavelmente o clima político no Brasil atravessa uma fase conturbada e de acirramento, em que é possível constatar uma divisão das opiniões públicas. As manifestações em apoio à Petrobrás que ocorrem em grandes cidades do país, hoje, e aquelas previstas para este domingo exigindo o impeachment da presidente Dilma Rousseff apenas confirmam um tenso cenário, cujas causas revelam um misto de indignação em relação à condução do país pelo governo e aos escândalos de corrupção envolvendo a maior empresa da América Latina como também uma não aceitação de uma votação legítima, que esteve de acordo com a vontade popular. Mesmo assim, o direito de se expressar por parte da população é inviolável assim como a violência e o irracionalismo nas manifestações desse fim de semana não devem ser tolerados.
       O único processo de impeachment envolvendo presidentes da República pôs fim precocemente ao mandato de Fernando Collor, em 1992. Naquelas circunstâncias, denúncias sobre envolvimento direto de Collor em esquemas de corrupção criaram conjuntamente a uma grave crise econômica uma pressão popular respaldada pelos principais meios de comunicação do país para que o primeiro presidente eleito em votação popular depois de 29 anos fosse impedido de continuar no comando do governo.
       Embora as investigações decorrentes da operação Lava-Jato, responsável por investigar a engrenagem de corrupção na Petrobras, estejam longe de terminar, não há, até agora, indícios de envolvimento direto da presidente como participante ou beneficiária do esquema de fraude, diferentemente de duas décadas atrás, como pode se comprovar ausência de seu nome na lista de políticos a serem investigados, divulgada na semana passada pelos órgãos de investigação.
       Ainda assim, questiona-se o conhecimento e a omissão de Dilma Rousseff  quanto aos desvios de verba pública enquanto ocupava os cargos de chefe do conselho de administração da empresa e, posteriormente, de ministra de Minas e Energia durante o governo Lula. Mesmo que tal omissão exista, ela somente poderá ser apurada após a presidente terminar seu mandato já que não foi uma violação cometida durante o exercício do cargo de chefe de Estado. Ser investigado não é sinônimo de culpado e, até o final das investigações, ninguém pode ser taxado de criminoso. Por mais que a lei possua suas brechas e contradições, algo que não é exclusivo do Brasil, e a justiça seja marcada pela lentidão, a continuidade do governo da presidente Dilma tem respaldo jurídico. O respeito às normas jurídicas são fundamentais para a manutenção da estabilidade política do país e o povo brasileiro sabe o quanto foi difícil ter o mínimo de estabilidade democrática após 21 longos anos de Ditadura Militar, quando a violação aos direitos humanos, o abuso de poder e a coação ditavam as regras.
       Não há dúvidas que o PT frustrou expectativas daqueles que o levaram ao poder a partir de 2002 com a eleição de Lula. O partido adotava um discurso até então coerente, de primor pela ética, de ser "diferente dos outros". Entretanto, os esquemas de corrupção evidenciados a partir do mensalão mostraram que o partido é apenas "mais do mesmo". Por outro lado, o impeachment é algo muito pequeno perto das necessidades urgentes de combater uma cultura de corrupção no país que afeta dos partidos políticos ao cidadão que suborna o policial na blitz; e mais insignificante ainda se não há motivos concretos para o propor. Tão importante quanto respeitar o direito dos cidadãos de manifestar sua justa indignação é respeitar outro valor fundamental: a vontade popular que reelegeu Dilma Rousseff em outubro do ano passado.
       É preciso reconhecer a impaciência do cidadão pela demora por mudanças mais profundas, mas Dilma está apenas no terceiro mês de seu segundo mandato. Caso ela consiga contornar a estagnação econômica do país, melhorar a qualidade de vida da população e combater a corrupção, seu partido tem o direito de receber uma nova chance. Caso contrário, poderemos escolher novas opções em 2018. É assim que o jogo funciona e, pode ter certeza, é o melhor caminho até agora que a humanidade encontrou. Pode ser lento, pode ser frustrante, mas é o melhor possível. Nosso papel é cada vez mais ter consciência na escolha de candidatos mais comprometidos com o bem-estar comum.
      
*Leia mais sobre o assunto
http://gabrielmarques.jusbrasil.com.br/artigos/172450520/o-que-e-impeachment
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2015/03/150309_dilma_impeachment_base_rm


                                                          Mattheus Reis