quarta-feira, 14 de junho de 2017

Na Cracolândia, o 'gestor' só mostrou ser mais do mesmo

     Vários prefeitos governaram São Paulo desde o surgimento das primeiras Cracolândias, nos anos 1990. Mas o descaso com os usuários de uma das drogas mais letais está longe do fim. E não é João Dória quem mudará esta situação, apesar de seu mandato ter apenas seis meses.
     Não mudará porque, para ele, o fim das cracolândias é uma questão de polícia e força, e não de saúde pública e inclusão social. Dória já comandou duas operações, com participação da tropa de choque da Polícia Militar, para expulsar dependentes do centro da cidade. Na primeira, no fim de maio, um prédio, que, segundo a Secretaria Municipal de Segurança, servia como ponto de venda e consumo, foi demolido sem os moradores serem avisados. Três deles ficaram feridos. E no último domingo, o alvo foi a Praça Princesa Isabel: barracas foram destruídas; colchões e cobertores queimados, deixando os usuários sem rumo e abrigo no frio da madrugada paulistana.

Insistindo no erro: Todas as operações feitas como a do último domingo por 
João Dória fracassaram em acabar com a cracolândia. 73% dos usuários de 
drogas do local não concordam com a forma que a Prefeitura lida com a questão.

     A Prefeitura apoia essas operações como “necessárias para coibir o tráfico”. Mas o que se vê não são apenas apreensões de drogas e prisões. O que mais se vê são abordagens condenadas pelo Ministério Público, Organização Mundial da Saúde e entidades de direitos humanos. Não há zelo com quem se encontra em clara vulnerabilidade social. Não há preocupação em combater o foco do problema por parte do prefeito, que prefere insistir em internações compulsórias, barradas pela Justiça.
   Segundo o Datafolha, 68% destes usuários são negros ou pardos, 56% só possuem ensino fundamental e 89% nunca receberam uma oferta de emprego sequer. O programa “De braços abertos”, adotado pela Prefeitura entre 2014 e 2016, ofereceu capacitação profissional, aulas de arte, moradia em hotéis e acompanhamento médico e psicológico. Elogiado pelo Conselho Mundial sobre Drogas na ONU, o projeto conseguiu que 88% dos 416. participantes reduzissem em, no mínimo 60%, o consumo de crack. Nitidamente a mais eficiente e humanizada estratégia até agora pensada para a Cracolândia. 
    Não houve, porém, continuidade ao “De braços abertos”. Apesar de sempre dizer que é diferente da “velha-política”, o atual prefeito seguiu a tradição de ignorar ações bem-sucedidas de governos anteriores. Bastou Dória se deparar com o primeiro desafio mais complexo de ser resolvido para ver a repetição de estratégias paliativas e ineficazes, que, no caso da Cracolândia, só obrigam os usuários de drogas a se instalarem em outros pontos da cidade. Sem acabar com o tráfico. Sem acabar com o vício. Isso não é ser um bom gestor.

                                                        Mattheus Reis

2 comentários:

  1. Excelente texto. Me fez repensar a gestão Dória q pouco acompanho. Bela iniciativa! Parabéns

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    1. A questão dele priorizar gestão e tal pode até dar um pouco mais de eficácia nos serviços públicos, mas pra certos temas, como a cracolândia, a herança dele elitizada e de pouco contato com as demandas populares fazem ele ter essa visão muito limitada de varrer pra longe, fazer uma limpeza. É nessas horas que não dá pra confiar só no marketing dele

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