segunda-feira, 20 de julho de 2015

Bandeira branca

                                  Os aplausos de Mandela




      

Gesto histórico: Obama e Castro se
cumprimentam  no funeral de Mandela.
       Aquele 10 de dezembro de 2013, dia chuvoso e triste na cidade de Johannesburgo, na África do Sul, por conta do funeral do grande líder e Nobel da paz Nelson Mandela, proporcionou, por outro lado, uma cena que despertou, na época, muita curiosidade e expectativa no mundo; uma cena cujo significado passamos a compreender e celebrar há pouco tempo: depois de décadas marcadas por acusações e ódio mútuos, Cuba e EUA se abraçaram através de um aperto de mão entre Barack Obama e Raúl Castro, irmão de Fidel Castro e, atualmente, presidente da ilha. Após uma série de rodadas de negociações, foi realizado hoje o primeiro evento concreto de uma reaproximação diplomática: a abertura das embaixadas americana e cubana nos dois países.
      A retomada de relações diplomáticas entre Cuba e EUA a partir do final do ano passado, mediada por importantes figuras como o Papa Francisco, é o início da queda de mais um resquício da Guerra Fria. Devido ao embargo econômico imposto pelos EUA e seus aliados em 1961, Cuba buscou suporte econômico na extinta União Soviética através de alinhamento político e ideológico, além da assinatura de acordos comerciais. Com o colapso da União Soviética e de suas áreas de influência nos anos 1990, o enclave socialista na América perdeu seu pilar de sustentação frente ao bloqueio americano. Desde então, a população de local convive mais intensamente com racionamentos de utensílios vitais, como alimentos.
       A partir da ascensão de Raúl Castro ao poder, proporcionada pela saúde debilitada de seu irmão mais velho, uma nova política de abertura gradual da economia - e que desembocou na reaproximação com o governo americano - foi posta em prática. Diante da crise econômica e da pressão interna e da comunidade internacional contra o autoritarismo no país, o governo cubano apontava como estratégia culpar a manutenção do embargo pela penúria, o que não deixa de ser, pelo menos em parte, verdadeiro.
       Obama, por sua vez, não terá tempo suficiente para finalizar uma aproximação plena. Com aproximadamente 1 ano e meio de mandato pela frente, dificilmente conseguirá cumprir as etapas mais importantes e, ao mesmo tempo, agudas das negociações: o debate sobre a desativação da prisão de Guantánamo e o tão complexo fim do embargo. O longo caminho a ser percorrido exige uma reconciliação contínua, progressiva, e, para isso, uma vitória do partido Democrata nas eleições presidenciais de 2016 e, consequentemente, a continuidade do legado de Obama parecem ser o único caminho viável já que a maior parte do partido opositor, o Republicano, se opõe a qualquer diálogo sobre o tema.
       Apesar dos poucos passos dados por enquanto, eles são animadores. Segundo o instituto de pesquisas Pew Research, 63% dos americanos aprovam a reaproximação. Esse dado comprova mais uma vitória para a diplomacia de Obama, que não gosta de resolver seus problemas e desavenças com uma arma nas mãos; uma grande mudança na forma como o regime político dos Castro dialoga e vê o mundo. Os desafios são mútuos e gigantes. Os EUA precisam promover uma abertura que não interfira na soberania de Cuba, não repetindo os exemplos de episódios como o da Emenda Platt e o da invasão à Baía dos porcos no século passado. Cuba, por sua vez, precisa compreender as marcas e os impactos negativos de uma estrutura de governança pautada por violações aos direitos humanos e censura prévia apesar dos invejáveis níveis de serviços públicos, como a saúde e a educação.
       Em meio à comoção gerada pela perda de um exemplo para a humanidade em 2013, um gesto simbolizou tudo o que Mandela sempre desejou e lutou: a união sem distinções entre povos. Se Mandela não pôde assistir ao vivo àquele aperto de mãos, ele aplaude, lá do alto, o que foi construído hoje. Um tijolo por vez. No dia dos amigos, EUA e Cuba mostraram pela primeira vez depois de 54 anos que, no mínimo, não desejam ser eternos inimigos. 


*Leia mais sobre o assunto!
http://noticias.terra.com.br/mundo/eua-e-cuba-retomam-relacoes-diplomaticas-veja-o-que-ja-mudou,91a47edd71de3790937a3f98cd124325w583RCRD.html
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/12/141217_cuba_eua_reaproximacao_rm




                                                      Mattheus Reis

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